sábado, 5 de julho de 2014

Amazonia Azul: O BRASIL ENTRA NA CORRIDA PELAS RIQUEZAS MARÍTIMAS. E pode, pela primeira vez, fincar sua bandeira em águas internacionais.

Foto - Marinha Brasileira.

Houve um tempo, há 200 milhões de anos, em que toda a terra do mundo era uma só. Lentamente, como todas as grandes mudanças geológicas que ocorrem no planeta, essa enorme massa foi se dividindo. As imensas fraturas originaram a América do Sul, África, Austrália, Antártica e Índia.

Passaram-se outros muitos milhões de anos, América e África se separaram e, entre elas, surgiu o Oceano Atlântico. Esse mar, que ninguém sabia onde e se iria terminar, amedrontou e seduziu civilizações. Até que destemidos navegadores, entre os séculos XV e XVII, singraram essas águas. Depois de meses, viajando a bordo de precárias embarcações, encontraram aquele pedaço de terra que, havia milênios, se desprendera da África.

Era um continente, a América. Na época, os países se envolveram em uma verdadeira corrida marítima para alcançar o território rico em ouro, pedras preciosas, outros minerais e recursos naturais.
Nas últimas décadas, uma nova competição nos oceanos se desencadeia entre as nações. Dessa vez, pelas riquezas de outra terra - aquela que está no fundo do mar. Nessa corrida, o Brasil poderá, ainda neste ano, desfraldar sua primeira bandeira em águas internacionais além do limite das 200 milhas náuticas (370 km).

A partir desta sexta-feira, os integrantes da International Seabed Authority (ISA) - em português denominada de Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (Isba) - se reúnem em Kingston, na Jamaica, e dirão se aceitam o plano de trabalho para exploração e pesquisa de uma área do Atlântico Sul conhecida como Elevação do Rio Grande.

e a permissão for concedida, o governo brasileiro ganha, por um período de 15 anos, o direito de pesquisar o potencial do território. Ele está a 1,5 mil quilômetros de distância da costa e recebeu o nome de elevação porque está a, aproximadamente, mil metros da superfície, numa região onde o oceano alcança quatro mil metros de profundidade.

Nele já foi constatada a existência de cobalto, níquel, cobre e manganês e outros metais: zircônio, tântalo, telúrio, tungstênio, nióbio, tório, bismuto, platina, cério, európio, molibdênio e lítio essenciais para a indústria de alta tecnologia. Cientificamente, eles são chamados de nódulos polimetálicos.
Em outra etapa, o país poderá explorar e até extrair esse minério. "Além do caráter estratégico, a iniciativa brasileira permitirá o desenvolvimento de recursos humanos e desenvolvimento tecnológico", explica o diretor de Geologia e Recursos Minerais da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), um órgão governamental.
O plano de trabalho na Elevação, entregue à ISA no último dia de dezembro de 2013, foi movido pelo interesse econômico, mas principalmente estratégico. Se o Brasil não se capacitar e explorar essa riqueza, outros países o farão. Há também um item importante incluído na permissão: o país que detém o controle da região pesquisada pode usar suas Forças Armadas para protegê-la. "As nações descobriram o mar, desenvolveram pesquisas e tecnologia para uso em grandes profundidades e perceberam que ali há tanta riqueza ou mais do que existe no continente", diz o almirante Marcos Silva Rodrigues, secretário da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (Secirm), um colegiado com a participação de 16 ministérios.
A Isba é uma organização internacional autônoma pertencente ao sistema das Nações Unidas. Por intermédio dela, 166 Estados partes organizam e controlam as atividades no mar, particularmente com vista à gestão de seus recursos minerais. Ela surgiu para aplicar as determinações da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, criada em dezembro de 1982 e em vigor desde julho de 1994.

A lei maior da organização, como se fosse a sua Constituição, afirma que o leito marinho, além das jurisdições nacionais, passa a ser considerado a "Área". Todos os recursos que ali estiverem, inclusive os minerais, são patrimônio da humanidade. É como se houvesse uma linha na água demarcando o que é de cada um e o que pertence a todos. Procurada pelo Valor, a Divisão do Mar, da Antártida e do Espaço do Ministério das Relações Exteriores preferiu não se pronunciar sobre o tema antes da reunião em Kingston.
No século XXI cresceu o interesse no mundo pela exploração mineral dos oceanos na chamada Área. A China já realizou prospecções na região e, não faz muito tempo, a China Ocean Mineral Resources Research and Development Association, estatal chinesa, anunciou a descoberta de depósitos hidrotermais (sinal da existência de minérios) no Atlântico Sul.

Os chineses já mapearam os locais onde eles estão e vêm manifestando interesse em associar-se, em joint ventures, e cooperar com outros países com o objetivo de conseguir concessões da Autoridade.
A Elevação do Rio Grande tem sido visitada pela Alemanha e pela Rússia. O Instituto de Pesquisa Alemão IFM-Geomar anunciou que ainda neste ano fará uma expedição oceanográfica no Atlântico Sul para ampliar o conhecimento sobre possíveis minerais identificados por britânicos e chineses.

A Rússia, que já faz pesquisas no Oceano Pacífico e no Atlântico Norte, quer marcar sua presença também no Atlântico Sul. "Se não investirmos, corremos o risco de ter um país estrangeiro extraindo riquezas ao lado das nossas fronteiras marítimas", diz Roberto Ventura, diretor do CPRM.
O valor dessas riquezas, por enquanto, é incomensurável. Mas os produtos que dependem desses minérios para existir são mais do que conhecidos. O cobalto é indispensável na produção de ligas metálicas na indústria de aviação; nos eletrodos das baterias elétricas dos chamados "carros verdes", movidos a eletricidade; e nos equipamentos que usam a radiação gama para os tratamentos de câncer.
Os depósitos de fosforita, que estão sendo mapeados nas bacias de Santos e Pelotas (RS), poderão fornecer esse mineral, imprescindível à indústria de fertilizantes. O Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes, mas responde por apenas 2% da produção mundial. O uso desses produtos aumentou de 3,1 milhões de toneladas em 1990 para 12,2 milhões de toneladas em 2012. Até 2017, acredita-se que o incremento será de 3,8% ao ano.
As principais culturas que dependem dos fertilizantes são: soja (34%), milho (18%), cana-de-açúcar (15%), café (7%), algodão (6%) e arroz (2%). "Considerando o volume de recursos que a mineração gera ao país e as perspectivas que se abrem com a exploração no mar, o governo precisa tratar desse assunto mais seriamente e aumentar essa discussão no Marco Regulatório da Mineração que tramita no Congresso", reclama o geólogo Agamenon Dantas, da consultoria Oceanis Mineral International.
A empresa trabalha com 40 profissionais da área que fazem diagnósticos e traçam perspectivas do setor para a iniciativa privada e governos. Um desses consultores é o geólogo Kaiser Gonçalves de Souza. Formado na Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Souza é mestre e doutor pela Université de Paris VI em geologia marinha.

Nascido no interior do Maranhão, registrado em Pernambuco - o pai pernambucano queria que o filho tivesse a mesma origem que ele -, Souza foi criado em Porto Alegre. Cedo se apaixonou pelo mar. Trabalhou na Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos e como diretor do Serviço Geológico do Brasil (CPRM - sigla advinda da razão social Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais).
Na década passada, com sua equipe, realizou aquele que é considerado o primeiro mapeamento da região submersa, agora requerido pelo governo brasileiro. O pedido informa a área pleiteada, cerca de 3 mil km2 no Atlântico Sul, e os investimentos, previstos em US$ 11 milhões nos primeiros cinco anos de contrato. "Não é muito, mas, nesse tipo de trabalho, o maior custo é com o aluguel de navios de outros países, porque não temos embarcações apropriadas para essa finalidade, e com as análises dos materias coletados", explica Souza, que acredita no sinal verde da Autoridade para o pedido.
Em 2011, foi fretado o navio de pesquisa Marion Dufresne, do Instituto Polar Francês. O CPRM contratou o navio com recursos financeiros do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do Ministério de Minas e Energia - aproximadamente R$ 60 milhões.

No ano passado, uma parceria científica entre o Brasil e o Japão permitiu coletar amostras - a 4.200 metros de profundidade - das rochas na Elevação do Rio Grande. Isso foi feito com o minissubmarino Sinkai - um dos poucos no mundo capaz de enfrentar as condições de profundidade até 6.500 metros -, equipado com braços mecânicos e câmeras de altíssima resolução.
Essas expedições também serviram para corroborar outra tese dos cientistas brasileiros em defesa da propriedade da Elevação. Ela faria parte de uma das montanhas da cadeia que ficou submersa em todo o Atlântico Sul, com alturas que chegam a 3.200 metros a partir do leito do oceano.

Ainda que localizada em águas internacionais, as rochas que foram encontradas demonstram que a região seria uma extensão das terras brasileiras inundadas pelo oceano, separando a margem continental brasileira das grandes profundidades oceânicas. "É como se um enorme pedaço de nosso continente tivesse sido coberto pela água. E, de fato, foi", afirma Ventura.
A busca por essa nova fronteira e seus recursos deu origem a mais do que um projeto: Levantamento da Plataforma Continental (Leplac), iniciado há duas décadas por cientistas; o Remplac, que avalia a potencialidade mineral da Plataforma Continental Jurídica Brasileira; e o Proarea (Programa de Prospecção e Exploração de Recursos Minerais do Atlântico Sul e Equatorial), onde está a pesquisa da Elevação do Rio Grande. "Eles são idênticos no objetivo, mas diferentes na área em que atuam.

Um está na jurisdição brasileira e outro na zona internacional dos oceanos. Na Plataforma - uma extensão geológica, como se fosse um minicontinente - encontram-se as mesmas rochas que na terra", explica Kaiser Souza.
"Se comprovarmos que o continente submerso é parte do Brasil, isso pode mudar toda a dimensão atual de nosso mar territorial", acrescenta Lauro Calliari, professor e doutor em oceanografia geológica do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), um dos mais importantes centros de estudos brasileiros sobre o assunto.
O Levantamento da Plataforma foi entregue à ONU em 2004 e é uma das vertentes da Amazônia Azul. A expressão foi criada pelo ex-comandante da Marinha Roberto de Guimarães Carvalho com o objetivo de mostrar à população que o mar brasileiro era tão importante quanto a Amazônia. "A Marinha nunca teve a intenção de promover uma disputa para medir a importância de uma ou outra área. Ambas são estratégicas para nosso país", diz o almirante José Roberto Bueno Junior, diretor do Centro de Comunicação Social da Marinha.
O Brasil tem cerca de 8,5 mil km de costa e uma área oceânica que totaliza quase 4,5 milhões de km2 sob sua jurisdição, divididos da seguinte forma: nas primeiras 12 milhas náuticas (22,2 km), o país tem a soberania total sobre a área, como se ela fosse uma extensão do continente; depois disso, nas outras 12 milhas subsequentes está a chamada Zona Contígua (de 12 a 24 milhas), onde as autoridades brasileiras têm a prerrogativa de fazer cumprir as legislações aduaneira, fiscal, sanitária ou imigratória.

Essas duas áreas estão dentro da Zona Econômica Exclusiva. Ela é definida como o espaço marítimo onde o país é soberano para fins de exploração, conservação e gestão dos recursos ali existentes, como, por exemplo, os do pré-sal. Atualmente, 91% do petróleo brasileiro vem do mar e grandes depósitos de de gás natural foram encontrados na bacia de Santos e no litoral do Espírito Santo.
A Amazônia Azul - 4,5 milhões de quilômetros quadrados, que equivalem a 52% do território continental do país - engloba projetos e ações nas áreas econômica, ambiental, científica e de soberania. No mar, as fronteiras não existem fisicamente. Portanto, é a existência de formas de dissuasão que permitem a um país mostrar aos outros seu domínio sobre a região. "Temos uma tradição de olhar o mar de maneira lúdica que precisa mudar. É necessário pensar no mar estrategicamente. Só para citar um exemplo, podemos lembrar que mais de 95% das exportações brasileiras são transportadas pelo mar", observa Bueno.
Se tantas riquezas circulam e estão nessas águas, resguardar a soberania sobre elas é uma das grandes preocupações das autoridades. "Somos, sim, um país com muitas carências. Sabemos também que nossas Forças Armadas não podem ser maiores do que a capacidade do Brasil de mantê-las.

Tudo isso, no entanto, não nos exime da obrigação de proteger a nação", afirma o secretário da Secirm, almirante Rodrigues. A Marinha desenvolve diversos projetos nesse sentido, como o Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub), que prevê a construção do submarino a propulsão nuclear e um sistema de vigilância e de monitoramento semelhante ao Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia).
Nem todos os desafios para iniciar a conquista do território marítimo além das atuais fronteiras estão encaminhados. Um deles é o de convencer a iniciativa privada a investir e a participar dos trabalhos na Elevação do Rio Grande, ainda que em etapas futuras. "Qualquer atividade no mar sempre será muito cara. A ciência fez já uma parte, identificando os minerais que ali estão. Agora a indústria brasileira, os grandes conglomerados de mineração, têm que participar também", afirma o professor Kaiser Souza.
Outro obstáculo a ser superado é o da proteção ambiental, que preocupa a comunidade científica. "Por mais que se trabalhe com projetos que busquem a sustentabilidade, sempre haverá algum impacto no ambiente marinho. Não é tão simples. Não é só ir até o fundo e tirar o minério", alerta o professor Calliari.
Edmo Campos, professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, um dos assessores da comissão do Ministério da Ciência e Tecnologia que organiza a criação do Instituto Nacional de Pesquisas Oceanográficas e Hidrovias, concorda com a posição de Calliari.

Ele é especialista em oceanografia física e coordena a participação brasileira, financiada pela Fapesp, na análise da circulação de calor no Atlântico Sul, o Samoc (South Atlantic Meridional Overtuning Circulation). "Já foi comprovado que essa região não é completamente destituída de vida. Sabe-se que há muitos organismos vivos ali que nem sequer foram classificados. Machuca os ouvidos dos cientistas a possibilidade de que eles desapareçam sem ter sido conhecidos", afirma Campos.
Atividades de mineração em águas profundas, observa Campos, são passíveis de acidentes cujos danos podem até atingir a costa. "O Brasil deve fazer as pesquisas. Mas não pode levar isso adiante sem um estudo criterioso do impacto. Há uma série de perguntas sobre esses trabalhos que não foram respondidas ainda", adverte.
Responder a todas as perguntas sobre o que existe nas profundezas do mar, considerada a última fronteira do mundo, é tarefa para muitas gerações. Até que o homem chegue lá, as descobertas científicas deverão diminuir, aos poucos, o sem-fim dessas questões. Mas certamente não conseguirão impedir que os segredos ocultos no fundo das águas, por muito tempo ainda, atemorizem e estimulem a imaginação daqueles que tentam decifrá-los.

Europa - Um investimento desastroso e os voos de seu diretor mancham o Greenpeace.




Kumi Naidoo (direita) e Pascal Hustin na França em 2009. / DAVID VINCENT (ASSOCIATED PRESS).

A ONG mais famosa da área ecológica sofreu dois golpes tão fortes que forçaram seus membros a pedir desculpas públicas.

ISABEL FERRER.

Haia  - A caminho de converter-se em uma rede ecologista global, as duas últimas semanas foram um teste para o Greenpeace. A ONG mais famosa do ramo, com escritórios em 41 países e quase 3 milhões de doadores, sofreu dois golpes tão fortes que forçaram seus membros, especializados em colocar Governos e multinacionais em situações embaraçosas, a pedir desculpas públicas. Causado por um erro humano, o primeiro tropeço parece fácil de explicar: sem pedir permissão, um de seus funcionários comprou divisas estrangeiras para financiar os trabalhos das sedes abertas fora do âmbito da União Europeia.

A operação não é ilegal, e o Greenpeace centraliza sua gestão financeira em sua central em Amsterdã (Greenpeace International) para proteger-se das flutuações do mercado de valores. O problema é que o funcionário calculou mal a cotação do euro e perdeu 3,8 milhões de euros (11,4 milhões de reais) de doações particulares. 

Tendo em conta que a própria organização cifrava em 2013 em 300 milhões de euros (900 milhões de reais) seu orçamento geral, dos quais 72,9 milhões de euros eram donativos, a falta de controle interno vai custar caro, literalmente.

O outro golpe recebido talvez chame menos a atenção, mas suas repercussões podem ser ainda maiores. Pascal Husting, seu chefe de campanhas, voou semanalmente de Luxemburgo, onde reside com sua família, à capital holandesa, onde trabalha. Em seu caso, a desejada conciliação trabalhista incorreu durante dois anos e meio no mesmo erro de qualquer executivo comum. 

Ou seja, contribuiu para uma emissão excessiva de gases do efeito estufa, um de seus piores vilões. Para cobrir uma distância de 359 quilômetros por rodovia, teriam sido gerados 142 quilos de CO2 em cada viagem. Em dois anos, é como se tivessem sido gastos sete barris de petróleo, segundo o serviço americano de proteção ambiental. Uma vergonha para um grupo que exige que os capitães da indústria mundial evitem os aviões para distâncias de menos de 1.000 quilômetros. E que, em 2010, foi ao Ártico para investigar a acidificação dos oceanos associada ao dióxido de carbono.

Como o próprio Husting admitiu ao telefone, em meio à voragem de críticas, “ir de trem me custa 12 horas, porque cruzo três países, mas agora compreendo que foi um engano”. “Peço desculpas a todos os que nos apoiam”, acrescentou. Ex-diretor do Greenpeace na França, ela trabalha no grupo há 20 anos e sua presença em Amsterdã é necessária. 

Da capital holandesa ele administra uma reorganização que esvaziará a sede central, para se concentrar em países onde possa combater a mudança climática. “Teremos escritórios em Washington, Taipé, Roma, Sydney, Hong Kong ou Copenhague, entre outras, mas levou mais tempo de que eu pensava para pôr isso em prática. 

De uma organização assentada na Holanda, passaremos a ser uma rede global. Nosso pessoal trabalhará de outra forma, e eu pegarei esta semana meu último voo. Depois, usarei a ferrovia. A sacudida das críticas, que foram muitas, serviu de incentivo para acelerar as mudanças”, disse.

Só na Holanda, o grupo perdeu 675 doadores (no mundo todo tem 454.000) irritados por seus deslocamentos. De qualquer forma, humilhado como está, Husting acredita que seu caso não compromete os valores da organização. “Não nos vendemos a nada nem a ninguém”, ressaltou.

Egbert Tellegen, catedrático emérito de meio ambiente e muito ativo hoje no Milieu Defensie, o ramo holandês da ONG Amigos da Terra, tem suas dúvidas. “O caso do mau investimento financeiro é um grande erro, mas não necessariamente um sintoma de que algo vá mal na organização. 

O empregado não obteve lucro e foi despedido. Já o caso dos aviões mostra a falta de atitude crítica ante esse tipo de contaminação. Mas o Greenpeace não é o único. Há cientistas muito comprometidos que não fazem nada mais do que voar para denunciar como se destrói o ambiente. Falta modéstia no mundo do meio ambiente, seja em universidades, Governos ou grupos ecologistas”, assinala.

Por sua vez, Jan Paul van Soest, assessor em matéria de sustentabilidade para os setores público e privado na Holanda, teme, sim, que o dinheiro perdido seja um sintoma de descontrole na administração. “As pessoas podem pensar que o Greenpeace perdeu o norte, quando a transferência de cifras nada tem a ver com seus objetivos”, diz. “Pode-se ser uma empresa de âmbito internacional com uma missão social, mas é preciso saber administrá-la. 

A exigência de transparência aumentou para qualquer organização, e eles não podem ficar atrás. O público quer que seu dinheiro seja gasto de forma adequada, e descentralizar é um exercício que deve ser bem feito”, assinala. Segundo a revista alemã Der Spiegel, que levantou o caso, o funcionário em questão comprou em 2013 divisas no valor de 36 milhões de euros (108 milhões de reais). 

Em 2014, comprou mais divisas – no valor de 23 milhões de euros (69 milhões de reais) –, sempre através da Monex Europe, uma entidade financeira com sede no Reino Unido e subsidiária da Holding Monex (México). O Greenpeace já tinha constatado em 2013 que a operação era um erro, mas não disse nada. A revista aponta que os ecologistas esperavam ter antes em mãos os resultados da auditoria encomendada à americana KPMG. As perdas, claro, aparecerão no relatório anual, previsto para julho.

O ativista sul-africano de direitos humanos Kumi Naidoo, atual diretor-executivo internacional do Greenpeace, é o motor do novo enfoque. Convencido de que as grandes ameaças ao meio ambiente estão nos países do Hemisfério Sul, ele incentiva a transferência de seu pessoal para onde haja desmatamento, oceanos em perigo, baleias caçadas, energia nuclear ou ecossistemas exaustos. Uma ambiciosa tarefa que não pode se enfraquecer no cofre. 

Quando o Artic Sunrise, um de seus navios, foi retido em setembro passado com seus 30 tripulantes no Ártico russo, seu destino mobilizou a opinião pública internacional. Até os mais críticos em relação aos métodos dos ativistas consideraram excessivo o zelo de Moscou ao acusá-los de pirataria por denunciar as prospecções feitas pela Gazprom na zona. Agora, por outro lado, as profusas desculpas que aparecem em todos os sites da organização na internet não dissipam o temor dos peritos consultados de que os problemas do departamento de finanças sejam estruturais.

“Vemos as ONGs, especialmente as mais conhecidas – Greenpeace, Anistia Internacional ou Human Rights Watch –, como a consciência coletiva da sociedade. Não notamos que elas se transformaram – eram grupos de pressão de fora do sistema, mas passaram a fazer parte dele. Já são organizações profissionais, e esperamos que administrem com eficácia seu dinheiro, que é nosso”, aponta um membro do Instituto de Relações Internacionais Clingendael, com sede em Haia. 

Apesar de não terem voto nas Nações Unidas, por exemplo, sua voz, influência e conhecimentos, às vezes superiores aos dos próprios Governos, “deram-lhes poder, visibilidade e uma reputação que devem ganhar diariamente”, acrescenta.

Dito de outro modo, o Greenpeace já é adulto e seu desejo de melhorar o mundo não é incompatível com os controles de qualidade que ele exige dos outros. “Em um cenário onde os Estados só podem trabalhar em colaboração com outros atores internacionais, entre eles as ONGs, não se pode colocar o dedo no olho sem pensar que se está também na mira do público”, conclui o integrante do Clingendael.

Fonte: El Páis.

DESABAMENTO DO VIADUTO DE GUARARAPES EM BELO HORIZONTE - PREFEITURA DIVIDE RESPONSABILIDADE PELA TRAGÉDIA COM CONSTRUTORA E TÉCNICOS RESPONSÁVEIS POR VISTORIAS.

 

O Secretário de Obras de Belo Horizonte, José Lauro Nogueira, segundo matéria publicada pelo Jornal O Estado de São Paulo, assumiu a responsabilidade da prefeitura no desabamento do Viaduto de Guararapes, ocorrido na última quinta-feira.

"BELO HORIZONTE - O secretário de Obras da Prefeitura de Belo Horizonte, José Lauro Nogueira, disse, nesta sexta-feira, 4, que a responsabilidade pela queda do viaduto, que deixou duas pessoas mortas 22 feridas, é "solidária". "A responsabilidade é da prefeitura, da construtora e dos técnicos contratados para fazer a vistoria das obras", disse Nogueira."

Segundo Nogueira houve falha na fiscalização e acompanhamento na OBRA que é de responsabilidade da SUDECAP - Prefeitura de Belo Horizonte. Ainda segundo Nogueira, não havia pressa alguma em inaugurar o Viaduto, que não era considerado como uma OBRA para a Copa do Mundo. 

AS CAUSA DO ACIDENTE

Em trinta dias deverá ser liberado um primeiro LAUDO PERICIAL apontando as causas do desabamento do Viaduto. Peritos da Prefeitura, Construtora, IBAPE e CREA, além do Ministério Público vão participar dessa etapa. A Polícia Civil de Minas Gerais já abriu inquérito para apurar responsabilidades.

NOTA DO GOVERNO FEDERAL

O governo Federal distribuiu nota, dizendo que está à disposição do governo da cidade de Belo Horizonte, e que vai apoiar a Prefeitura naquilo que for solicitado. Segundo a Ministra do Planejamento, Míriam Belchior, o governo Federal é responsável pelo financiamento e liberação dos recursos para o empreendimento, e fiscaliza apenas, através de engenheiros da CAIXA ECONÔMICA, o andamento e as medições de etapas concluídas, exclusivamente para liberação de pagamentos e das verbas complementares necessárias. Segundo ainda a ministra, cabe às prefeituras que são as executoras das obras, a tarefa de fiscalizar a segurança do empreendimento.

NOTA DO BLOG

Triste ver que existam pessoas tentando tirar proveito político-eleitoreiro dessa tragédia.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Sexta Cúpula dos BRICS: as “sementes” de uma nova “arquitetura financeira”.

[*] Ariel Noyola Rodríguez, Contralínea, México - Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu.

Foto - Rede Casthor.

No dia seguinte do final da Copa do Mundo de futebol no Brasil, acontecerá a VIª Cúpula dos BRICS (sigla de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Fortaleza e Brasília serão as cidades anfitriãs do encontro, que acontecerá dias 14, 15 e 16 de julho/2014, para assentar afinal uma arquitetura financeira de novo perfil, sob o slogan: “Crescimento inclusivo e soluções sustentáveis”.

Diferentes das iniciativas de regionalização financeira asiática e sul-americana, os países BRICS, ao não definir espaço geográfico comum, ao tempo em que estão menos expostos a sofrer turbulências financeiras todos ao mesmo tempo, aumentam a efetividade de seus instrumentos defensivos.

Um fundo monetário de estabilização, denominado “Acordo de Reservas de Contingência” (CRA, do inglês Contingent Reserve Arrangement) e um banco de desenvolvimento, chamado Banco BRICS, exercerão funções de mecanismo multilateral de apoio às balanças de pagamento e fundo de financiamento para o investimento. De fato, os BRICS estão se afastando do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, instituições criadas há 70 anos, sob a órbita do Departamento do Tesouro dos EUA. Em meio à crise, as duas iniciativas abrem espaços de cooperação financeira frente à volatilidade do US$ (dólar dos EUA), e alternativas de financiamento para países em situação crítica, sem submeter-se a condicionalidades mediante programas de ajuste estrutural e reconversão econômica.

Como consequência da crescente desaceleração econômica mundial, tornou-se mais complicado para os países BRICS alcançar taxas de crescimento superiores a 5%. A queda sustentada do preço das matérias primas para uso industrial, derivada de uma menor demanda do continente asiático e a volta dos capitais de prazo para Wall Street impactaram negativamente o comércio exterior e os tipos de câmbio.

Queda do US$ (dólar dos EUA) ante o Euro e moedas dos BRICS
Exceto uma pequena apreciação do Yuan, as moedas dos países BRICS perderam, de 8,80 (rúpia indiana) e até 16 (rand sul-africano) pontos percentuais frente ao US$, entre maio de 2013 e junho do ano em curso. Nesse sentido, o CRA dos BRICS – dotado de um total de 100 bilhões de US$ dólares, anunciados em março de 2013, com aportes da China, de 41 bilhões de dólares; de Brasil, Índia e Rússia, 18 bilhões cada um; e África do Sul, com 5 bilhões de dólares – uma vez posto em andamento, reduzirá substantivamente a volatilidade cambial sobre os fluxos de comércio e investimento, entre os membros do grupo.

Os céticos argumentam que o CRA terá importância secundária e só terá funções complementares às do FMI. Deixam sem considerar que, em contraste com a Iniciativa Chiang Mai, por exemplo (integrada por China, Japão, Coreia do Sul e dez economias da ASEAN, Associação de Nações do Sudeste Asiático), o CRA dos BRICS poderá prescindir do aval do FMI para fazer seus empréstimos, com o que garante maior autonomia política frente a Washington. A guerra de divisas das economias centrais contra as economias da periferia capitalista exige que esse CRA dos BRICS seja executado, e com a máxima rapidez.

Por outro lado, o Banco BRICS despertou muitas expectativas. O Banco que começará a operar com um capital de US$ 50 bilhões (aportes de US$ 20 bi e US$ 40 bi em garantias, de cada um dos membros), terá possibilidades de ampliar-se em dois anos, para US$ 100 bi; e em cinco anos, para US$ 200 bi; terá capacidade de financiamento de até US$ 350 bi de dólares para projetos de infraestrutura, educação, saúde, ciência e tecnologia, meio ambiente, etc. Contudo, para o caso da América do Sul, os efeitos no médio prazo têm caráter duplo. Nem tudo é mel sobre açúcar nos mercados de crédito. Por um lado, o Banco BRICS bem poderia contribuir para diminuir os custos de financiamento e fortalecer a função contracíclica da Corporación Andina de Fomento (CAF), mediante o aumento de créditos em momentos de crise, e assim descartar os empréstimos do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Por outro lado, porém, como ofertador de crédito, o Banco BRICS entraria em concorrência com outras entidades financeiras de influência considerável na região, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, brasileiro), a CAF e os bancos chineses com maior potencial (China Development Bank e Exim Bank of China). É inverossímil que as instituições financeiras façam convergir suas ofertas de crédito, de modo complementar, sem afetar as respectivas carteiras de credores.


Também há atritos entre os próprios países BRICS. A elite chinesa pretende fazer o aporte majoritário (a proposta russa é que os aportes sejam feitos por alíquotas) e que o organismo tenha sede em Xangai (não em Nova Delhi, Moscou ou Johannesburgo). No caso de os empréstimos do Banco BRICS serem denominados em Yuan, a moeda chinesa estará avançando na própria internacionalização e reforçará gradualmente sua posição, como meio de pagamento e moeda de reserva , em detrimento de outras divisas.

Mas, além da consolidação de um mundo multipolar, o CRA e o Banco BRICS representam as sementes de uma arquitetura financeira que emerge numa etapa da crise cheia de contradições, ao mesmo tempo caracterizada pela cooperação e pela rivalidade financeira.



[*] Ariel Noyola Rodríguez é membro do Observatorio Económico de América Latina e do Instituto de Investigaciones Económicas, da Universidade Nacional Autônoma do México.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Tragédia em São Paulo - Cabo da Policia Militar assassina com um tiro nas costas jovem atriz de 24 anos.


Atriz é assassinada pela polícia um dia após seu aniversário. 
Atriz e produtora cultural, Luana Barbosa, 24 anos, completou aniversário ontem e morreu hoje após ser baleada por um policial militar.

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A atriz e produtora cultural Luana Carlana de Almeida Barbosa, de 24 anos, foi atingida por disparo de tiro no tórax ao passar por um bloqueio de trânsito realizado pela Polícia Militar em Presidente Prudente, na manhã desta sexta-feira (27). Ela era passageira de uma motocicleta que passava pela blitz. Luana completou aniversário ontem.
Segundo a PM, a vítima foi encaminhada ao pronto-socorro, depois de socorrida pela Unidade de Resgate do Corpo de Bombeiros, em estado grave. No entanto, ela não resistiu ao ferimento e morreu no hospital. O caso ocorreu por volta das 9h30.
Em sua página em uma rede social, consta que Luana é atriz e produtora da Federação Prudentina de Teatro e Artes Integradas e do Circo e Teatro de Rua “Os Mamatchas”.
Em sua última postagem, na quinta-feira (26), ela agradecia as mensagens de aniversário e convidava a todos para dar-lhe os parabéns pessoalmente nesta sexta-feira (27) durante um espetáculo e a festa junina da federação. O evento foi cancelado.
De acordo com o amigo da vítima, Tiago Munhoz, a família está em choque com a notícia sobre a morte de Luana.

Investigação

A Polícia Militar informou que ainda vai apurar os detalhes do caso e que as circunstâncias do disparo serão melhores esclarecidas. A corporação confirmou que o disparo que atingiu a passageira da moto partiu de um dos policiais que participavam da operação.
A corporação também explicou que o policial que efetuou o disparo foi autuado em flagrante delito e conduzido ao presídio militar Romão Gomes, em São Paulo (SP). Além disso, um inquérito policial militar também foi instaurado para apurar detalhadamente todas as circunstâncias e os motivos que envolveram o disparo.
Na mesma nota, a PM enfatizou que a vítima foi “imediatamente socorrida”, mas “lamentavelmente veio a falecer”.
O capitão Carlos Olivetti informou que o policial que atirou na jovem é um cabo, com 23 anos de serviços prestados à PM. No entanto, a corporação se recusou a divulgar o nome do envolvido. Segundo Olivetti, o inquérito policial militar tem um prazo inicial de 40 dias, que pode ser prorrogado por mais 20 dias, se houver necessidade.
A Polícia Civil também investiga o caso.
(Fotos de Luana Barbosa retiradas de seu Facebook)
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DEPOIS DE SUSTO, ÍNDIOS ASHANINKA FAZEM CONTATO COM TRIBO DESCONHECIDA NO ACRE.



Região do Alto Envira onde vivem os índios Ashaninka (Foto: Sérgio Vale/Secom)Região do Alto Envira onde vivem os índios Ashaninka (Foto: Sérgio Vale/Secom)
A Fundação Nacional do Índio informou nesta terça-feira (1º) que um povo indígena desconhecido que vive isolado na floresta amazônica estabeleceu o primeiro contato com índios da etnia Ashaninka e servidores do órgão no Alto Rio Envira, na fronteira do Estado do Acre com o Peru. Na região, que é alvo de invasão de madeireiros e narcotraficantes, foram avistados ao menos três grupos de índios sem contato nos últimos 30 anos pelas equipes da Frente de Proteção aos Índios Isolados da Funai.
Segundo a Funai, o contato do povo indígena isolado aconteceu de forma pacífica na aldeia Simpatia, que fica na terra indígena Kampa (Ashaninka) e Isolados do Alto Envira, no dia 29 de junho. Mas há 20 dias, os índios desconhecidos assustaram mulheres e crianças Ashaninka quando apareceram nas malocas pegando panelas e facões.
O clima ficou tenso entre índios desconhecidos e os Ashaninka, o que levou o Governo do Acre a realizar uma operação de segurança com apoio do Exército e da Polícia Federal na fronteira.
Em nota divulgada no dia 17 de junho, o Governo do Acre informou que a chamada Operação Simpatia consistia em averiguar as ameaças que a comunidade Ashaninka recebiam de “índios isolados” e classificou os desconhecidos de “saqueadores”.
A tentativa de furto foi à casa do indígena Raimundinho Kampa. Segundo ele, os índios (isolados) tentaram levar panelas, roupas e utensílios domésticos, mas foram surpreendidos quando Raimundinho correu e arrancou os itens das mãos dos saqueadores”, disse o governo do Acre na nota.
Diante da aproximação dos índios isolados na aldeia Simpatia, o  coordenador-geral de Índios Isolados e Recém Contatados da Funai, Carlos Travassos, viajou para região para acompanhar o trabalho das equipe da Frente de Proteção Etnoambiental Envira e do sertanista José Carlos Meirelles, da Assessoria Indígena do Governo do Estado do Acre. A Funai não divulgou fotografias do encontro dos Ashaninka.
Esse é o primeiro contato desde a criação da Frente na década de 80. O que a gente não consegue afirmar com certeza é se esse grupo contatado é o mesmo desses três que nós monitoramos ou se é um outro grupo. O povo apareceu na aldeia Simpatia e houve uma tentativa de diálogo, se estabelecendo o contato. Não foi possível indentificar a língua que eles falam. Estamos enviando linguistas para região”, afirmou Leonardo Lenin, coordenador substituito da Coordenação-Geral de Índios Isolados e Recém Contatados, à agência Amazônia Real.
Segundo a Funai, a equipe recebe apoio do Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI, do Alto Rio Juruá/Secretaria Especial de Saúde Indígena para desenvolver o Plano de Contingência para Situações de Contato e evitar que os dois povos indígenas contraem doenças.
Na região do Alto Envira na fronteira com o Peru, os três grupos de índios isolados avistados em 30 anos de pesquisas foram denominados pela Funai como o povo da cabeceireira do Riozinho, o povo do Rio Xinane e o povo do Rio Humaitá. Há um quarto grupo isolado no Acre que é denominado de Mashco-Piro. Com o contato na aldeia Simpatia, a fundação tenta qualificar os índios desconhecidos por meio de interpretes para que haja maior conhecimento do grupo e sua língua.
A Funai diz que a Politica de Proteção aos Índios Isolados tem como  premissa não fazer o contato para respeitar a autodeterminação dos povos. O objetivo é  realizar o trabalho de proteção territorial com a presença deles. No entanto, é previsto ações de intervenção – como planos de contingência – quando o grupo indígena isolado procura estabelecer o contato.
Na aldeia Simpatia, onde ocorreu o contato, vivem ao menos 70 índios Ashaninka, sendo a maioria mulheres e crianças. A comunidade está localizada na Terra Indígena Kampa e Isolados do Rio Envira, regularizada pela Funai com 232.795 hectares. Na reserva existem seis aldeias Ashaninka onde moram 420 índios da etnia. Os indígenas Ashaninka pertencem a família lingüística Aruak (ou Arawak).

Proteção aos índios isolados é “desfalcada” de recursos
Leia a entrevista exclusiva com Leonardo Lenin, o coordenador substituto da Coordenação-Geral de Índios Isolados da Funai.
Qual o provável motivo para o povo indígena isolado se aproximar da aldeia Simpatia dos índios Ashaninka?
Essa região do Acre na fronteira com o Peru, conhecida como Paralelo 10, é formada por unidades de conservação como áreas indígenas. O que acontece é que do lado brasileiro a Funai está conseguindo fazer um trabalho de proteção daquela região. Do lado peruano, tem muitos informes sobre abertura de estradas, ocupação por extração de madeira e áreas de uso irregular. O que pode estar havendo é uma intensificação do lado do Brasil, por estar um pouco mais protegida, desses grupos de índios isolados.Isso pressiona esses grupos que já existem do lado brasileiro, inclusive de isolados também.  O que a gente tem tentado é que, uma vez que não se trata somente de índios isolados do lado brasileiro, é buscarmos aumentar a interlocução com o governo peruano para discutir essa situação.
Do lado brasileiro, qual é a situação das terras dos índios isolados?
Na região do Acre, fora a do Alto Tarauaca que é de uso exclusivo dos índios isolados, tem as outras áreas que chamamos de uso compartilhado com índios isolados e outros grupos, por exemplo os Ashaninka. Na região do Acre temos uma região para fazer um estudo de reedição de uso para a proteção desses grupos, área que está sendo analisada pela Funai.
São terras indígenas no Acre: o Alto Tarauacá, Ponta Isolada do Rio Envira, Terra Indígena do Riozinho do Alto Envira e Kaxinawá do Rio Humaitá. Essas terras estão com o processo de regularização concluso. Essa região do Riozinho, na divisa com Alto Envira com Alto Tarauacá, é que temos a notícia da presença dos índios isolados na aldeia Simpatia, que é a última aldeia indígena do lado brasileiro.
A Funai relatou que o povo indígena isolado apareceu por volta do dia 10 de junho na aldeia Simpatia. O que aconteceu que assustou os Ashaninka?
Não temos como confirmar quantos índios apaceram na aldeia Simpatia. Com a ajuda do sertanista José Carlos Meirelles, da Assessoria Indígena do Governo do Estado do Acre, que é parceira nossa, a equipe fez um sobrevoo de helicóptero à região. Obviamente não foi avistado o grupo, mas foram coletadas informações na aldeia Simpatia e observado o registro desse grupo. O que acontece é que temos visto que, até por este crescimento populacional, nesse período de estiagem há a saída desses grupos isolados que se dirigem para esses locais onde eles encontram facão, machado, panelas. Eles vão buscar essas ferramentas que, óbvio, eles já encorporaram ao cotidiano deles e, não tem outra forma deles adquirir, a não ser nessas comunidades vizinhas. Essas aquisições, obiviamente, deixam as popuações dos Ashaninka, dos Kaxinawá bem inseguros.
Para evitar a insegurança dos povos Ashaninka e eventuais conflitos que medidas a Funai vai tomar?
O que a gente tem que fazer dentro da política do não contato é a proteção territorial. Essa proteção territorial se dá com servidores extremamente e minimarmente estruturados para realizar o trabalho em campo, seja de garimpeiros, incursão em campo, seja de narcotráfico na região.
Uma outra ação é fazer um trabalho no entorno, que é você ver como esses grupos isolados estão impactando a ocupação territorial desses grupos já estabelecidos como os Ashaninka. Temos um trabalho de avaliar esses impactos para tentar compensar os problemas, mitigar essas relações, mas também muito trabalho de sensibilizar esses grupos para os ajudar na proteção dos índios isolados. A outra coisa na proteção desse índios isolados é a situação de saúde. Esses grupos podem sofrer decréscimo populacional por doenças que eles não adquiriram ainda. Então nessa ação que estamos fazendo agora, tem uma equipe da Sesai acompanhando a equipe da Funai para fazer o diagnóstico do atendiemnto de saúde, que é muito precário na aldeia Ashaninka. Uma vez que estamos fazendo a ação e o atendimento dos Ashaninka, estamos de alguma forma protegendo os índios isolados.
O governo do Acre tratou os índios isolados como “saqueadores”. Como a Funai trata os índios isolados na situação com os Ashaninka?
Temos uma equipe da Funai lá, inclusive, com uma pessoa do Governo do Acre, que é o sertanista Meireles, que foi coordenador da Frente por muito tempo, para qualificar esse grupo. Se esse grupo é um dos três que já monitoramos ou se é outro grupo, ou é um grupo vindo do Peru, é um grupo vulneravel. Eles estão fugindo de uma situação extrema, e a gente não vai colocar eles como uma situação de ilegal. A gente não tem nem a confirmação de quem é esse grupo. Então a gente vai se esforçar para fazer a qualificação para fazer alguma tipo de afirmação.
Essa situação entre índios isolados e Ashaninka é a mais crítica que se tem notícia?
A situaçao do Acre que já era assim. Toda situação que acompanhamos com os índios isolados é sempre muito vulnerável. Em relação ao Acre a gente tem sempre uma preocupação justamente por ser áreas que têm  a presença de outros grupos da região. É esse receio de haver um embate. A situação é crítica porque a gente continua trabalhando sem o aporte necessário para essa atribuição. O servidor precisa ficar muito tempo em campo e com o material suficente para ter seguraça. E temos históricos da Funai de dificuldades tanto com recursos humanos e orçamentários.
Nessa região do rio Envira e rio Xinane tínhamos duas bases de proteção. Hoje nós não coseguimos manter uma frente por causa dessas questão de recursos humanos e orçamentários. A outra base que era na aldeia Simpatia deixou de existir em 2011. Tivemos que abandonar a base em função da presença de naricotraficantes na região peruana.
Então, além da dificuldade da ocupação interna da Funai de recursos humanos e orçamentários, temos outras ações que independem da ação da Funai que é o controle de acesso, que é muito além das atribuições da Funai, estão ligadas aos orgãos de segurança do Estado Brasileiro.
Qual o orçamento da Coordenação-Geral de Índios Isolados e Recém Contatos para 2014?
A previsão para 2014 era de um orçamento de R$ 2.661.435,00 e tivemos um contigenciamento de R$ 738 mil, o que está fazendo a gente trabalhar esse ano com um recurso de R$ 1.863.005,00. A estimativa que tínhamos para trabalhar nas 12 Frentes de Proteção Etnoambiental e 36 equipes desde a reestrução ao material permanente é de até R$ 18 milhões, sem incluir os recursos humanos. Seria um recurso para mantermos as bases, fazer as expedições em regiões que ainda não temos a confirmação da presença dos índios isolados. Então você vê o quanto estamos desfalcados nesse atendimento das frentes. Isso revela bem a fragilidade da qualidade do nosso trabalho.