sábado, 27 de fevereiro de 2016

As novas mentiras para manter o velho sistema de transporte (por Júlio Câmara).

A última semana iniciou com a vida mais cara para os porto-alegrenses. 
Sem debate com a população e, pela primeira vez em 30 anos sem apresentar a planilha para qualquer instituição do controle social, o prefeito sancionou o maior aumento do país levando a passagem de R$3,25 para R$3,75.
Embora não tenha se esforçado para construir uma ampla discussão com participação popular sobre o transporte público, a prefeitura investiu em publicidade e anunciou nos principais jornais que Porto Alegre estaria vivendo um dia histórico com a ativação do “novo sistema de transporte público”. Mas, apesar dos anúncios caros e coloridos, o aumento de 50 centavos na tarifa não foi bem recebido por quem anda de ônibus na nossa cidade.
Na prática, o que se comprova é que o novo sistema é fruto de uma licitação de cartas marcadas que acabou com a vitória dos mesmos empresários. A adesivagem e pintura dos velhos ônibus é a tática para esconder que os ônibus novos não chegam a ser 18% da frota total em circulação. Dos 296 ônibus novos anunciados, apenas 12 representam um aumento real na frota enquanto o restante apenas substituiu outros que já circulavam. Ou seja, 12 novos ônibus em nada resolvem os problemas de superlotação e o tempo de espera que resulta em filas nas paradas.
O que faz a prefeitura, em parceria com os empresários, é impulsionar uma estética de novidade para continuar fazendo o mesmo que fazem desde que os primeiros ônibus passaram a circular em Porto Alegre. Tratam o direito ao transporte público através da lógica de mercadoria e obtenção de lucro.
Com as grandes manifestações contra o aumento da passagem em 2013, fechou-se o cerco em torno do cartel do transporte que foram desmascarados pelo Tribunal de Contas do Estado. O relatório da auditoria do TCE revelou que os empresários justificavam o aumento com custos e gastos inflacionados e também mentiam que a média de lucratividade ficava em 6,33% enquanto na verdade era de 9,74%.
No ano seguinte, quem desnudou o cartel foram os rodoviários que protagonizaram uma greve histórica. Enquanto a prefeitura coloca a conta do aumento para cima dos motoristas e cobradores, o que vemos na prática é que o poder aquisitivo dos trabalhadores diminui a cada ano. Em 1994, o salário do motorista equivalia a 1.184 passagens. Em 2013, 667 e em 2016 fica em 646 passagens.
Talvez a maior decepção dos passageiros seja o reduzido número de ônibus com ar condicionado. O prefeito José Fortunati afirmou, ao vivo em um programa de rádio, que desses novos ônibus 100% são climatizados. No mesmo programa, alguns minutos depois, o presidente da EPTC,  Vanderlei Capellari, teve que desmentir o prefeito diante das reações dos ouvintes, afirmando que apenas 210 possuem ar condicionado.
Para piorar, a meta das empresas é uma frota 100% climatizada apenas em 2026. Contraditoriamente, em 2015 o prefeito entrou na justiça para derrubar o projeto aprovado na Câmara Municipal que obrigada a climatização de todos os novos ônibus. Venceu na justiça e justificou que a instalação de ar-condicionado resultaria num aumento de 13 centavos na passagem. Agora, a passagem aumentou 50 centavos e nem 25% da frota conta com os equipamentos. Tem alguém mentindo nesta história?
Em 2013 tocamos forte mobilização nas ruas construídas através de assembleias abertas e democráticas que conseguiram desmascarar a farsa do aumento e movimentou Porto Alegre massivamente. Precisamos desconstruir a máquina de propaganda da prefeitura que tenta convencer que é justo pagarmos o preço da nova passagem para andar no ônibus velho sem nenhum aumento significativo na frota, nas linhas e nas tabelas horários. O desafio é imprimir um ritmo no debate e na luta que encurrale a prefeitura e os empresários que são muito menos de 0,01% da população de Porto Alegre mas fazem o que querem para aumentar seus lucros com o direito de ir e vir de 99,9% dos porto-alegrenses.
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Júlio Câmara é estudante de jornalismo, coordenador do DCE da UFRGS e do coletivo Juntos.

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